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20, Mafaldinha, 20 !

por PR, em 14.07.20

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Dá-se o caso de ter uma filha com 20 anos. E dou comigo a sentir muita coisa, ao mesmo tempo. Uma descarga de memórias, em flashes curtos, de muitos momentos diferentes, destes - meu Deus! - vinte anos. A Mafaldinha. 20 anos, hoje. A minha Muffy, que só dormiu uma note inteira já tinha bem mais que um ano. A minha primeira filha, que sempre foi de uma meiguice muito dela, desde os tempos em que alinhava bonecada no chão da sala, distribuindo imaginários almoços e jantares, até aos dias de hoje, em que, com a mesma doçura, me diz que teve 16 num exame da faculdade. Não estou a conseguir processar, a verdade é essa, tudo o que estou a sentir, com este 14 de Julho, confesso. Vinte anos é um numero redondo, de entrada na definitiva idade adulta, este comboio partiu e vai deixar de parar em todas. Para mim. Também me mostra, sem clemência, que o tempo está a passar, e a passar com vertigem. Um dia, tinha ela uns dez anos, estive mais de uma hora sem saber onde estaria. Percorri ruas e lugares onde ela pudesse estar, e nada. Um pânico de perda iminente que me marcou para sempre. Nesse dia, escrevi que tinha aprendido o que era estar morto. Um arrepio estranho atravessa-me o espírito, agora mesmo, ao pensar no que teria sido a nossa vida, se. Que pensamento tão tenebroso, tão horrível, e logo, o alivio a seguir. Ela aí está. Faz 20 anos, hoje. E dou comigo infinitamente grato, com a mesma emoção com que ouvi, nesse dia, a inquieta voz dela, no telefone, no fim da maior das angústias, a dizer:“Pai”. Minha querida Mafaldinha. A irmã incansável que ela é, do seu companheiro maior Gonçalo, às manas Maria e Carminho e aos irmãos novos que a vida lhe deu: Kiko e Miguel. É comovente perceber como todos a adoram, como ela é uma referência que eles têm, de brincadeira, carinho, ternura infinita. Admiração que sentem e ainda não se apercebem, mas está nos gestos, na forma como a olham, como correm para ela quando ela chega. Quando crescerem vão, de certeza, dar o devido valor em terem nela a sua irmã mais velha. Em todos os anos, em todas as etapas de escola por onde passou, nunca ouvi nenhuma descrição dela, da parte e educadoras e professoras, que não fosse genuinamente enternecida. Toda a gente a adora. Que orgulho. Que emocionante é este dia. A Mafaldinha faz 20 anos. Sensibilidade muitas vezes calada e recolhida, igual a mim nisso, mas de lágrima fácil outras vezes - igual -, sentido humanista da vida, respeito absoluto por valores como a Liberdade, a Justiça, a Igualdade de Direitos, a Sustentabilidade. E o sonho de percorrer mundo, conhecer mais, sempre. Estuda nutrição, tendo decidido, sozinha e muito cedo, que não ia comer mais carne. E manteve-se firme, sem vacilar. Ei-la que entrou na vida académica, abraçando comissões de praxe e vestindo traje, mesmo quando está um calor de verão fora de época. As viagens, manhã muito cedo, ora em sonolento silêncio, ora a ouvir músicas e na conversa, de casa ao Marquês, para apanhar metro para a faculdade. Vou sentir tantas saudades destas boleias. A Mafaldinha faz 20 anos. Nasceu de demorado parto, eu estava uma t-shirt cor de laranja dos Garbage vestida, e lembro-me de ter saído da maternidade e ter ido à rádio, adaptar livremente um poema de Ary dos Santos para os filhos do Fernando Tordo, à chegada dela ao mundo.
(…)

Um filho é ver-se um homem prolongado
no mundo da verdade em que nasceu
um filho é ver-se um homem atirado
das raízes da terra para o céu.
Eu tinha uma carrinha Volvo, cinzenta, e vim pela A5 até casa a apitar ligar 4 piscas de euforia, enquanto gritava o “Espalhem a Notícia”:
“Depois de entre os escombros
Ergueram-se dois ombros
Num murmúrio
E o sol, como é costume, foi um augúrio de bonança
Sãos e salvos, felizmente
E como o riso vem ao ventre
Assim veio de repente Uma criança”
 
 
Depois cheguei a casa, emborquei uma garrafa de champagne, sabor a pêssego (verdade!) , que por lá estava, liguei ao meu amigo Luís Costa e fomos festejar, bebendo um copo numa varanda de um bar na Marina de Cascais. mal eu imaginava que o centro da minha vida se instalaria em Cascais, muito anos depois. E hoje passam 20 anos desde essa sexta-feira. A Mafalda, que atravessou as tempestades adjacentes à sua existência, com uma inata sabedoria, que parte de uma capacidade rara de observar e adaptar-se, que parece que vir do fundo dos tempos. A maior cúmplice e companheira da mãe, figura central na vida de todos nós. Olho para as fotografias destes anos todos, desde as primeiras, com ela bebé (foi uma bebé tão gira - e aqui comovo-me, sim), foi uma criança alegre, uma miúda que recebeu o irmão com um amor instantâneo avassalador e perene, olho para estas imagens, ano após ano, e reconheço-a, em cada idade, contexto, em cada pedaço de vida vivida, numa constante de confiança impossível de abalar. a Mafaldinha, porto seguro, ser de sonhos e de sorriso que vem da alma. É um tesouro que se guarda com a certeza de ser tão precioso como a vida em si mesma. Noutro dia, íamos de viagem, e vinha com o Gonçalo e a Maria, a cantar musicas dos filmes da Disney que ela via em miúda. Kenai & Koda, Mulan, Rei Leão…e ela ali a cantar, toda contente. Só muito depois, viemos a saber que ela estava angustiada com um problema dela. Mas foi generosa ao ponto de puxar pela alegria de estar comigo e aqueles dois irmãos no carro, para arrumar a tristeza dela a um canto, e cantar, feliz pela estrada fora. Achei isso tão bonito. 20 anos de ti, minha querida Mafaldinha, meu amor! Das coisas que mais satisfação me dão é assistir, deliciado, à relação de cumplicidade que ela e a Rita construíram. Estão na vida uma da outra há quase dez anos, sei que construíram um universo delas, só delas, que é encantador, aos meus olhos. Tão bom. A Mafaldinha faz 20 anos hoje. Tinha-lhe prometido, ao longo de anos e anos, que, quando ela fizesse 20 anos, e tendo nascido no dia da Tomada da Bastilha, festejaríamos em Paris. Fazer 20 anos, e ser este desgraçado ano de Pandemia, trocou a voltas a todos os planos, mas tenho a certeza que vai ter um dia muito muito feliz. Ser feliz é estarmos juntos. Todos. Sei que hoje vou comover-me muito, a olhar para a mulher em que a minha Mafaldinha está a transformar-se. Uma miúda que vibra com roupa, maquilhagem, música, brunch, praia, Rio de Janeiro, a família, o namoro mais longo do que a idade dela -e dele - faria adivinhar, a permanente ânsia de viajar, conhecer mundo e mundos. Uma miúda de leituras, de banhos de sol, de dormir até tarde, de ter pouco jeito para arrumar o quarto, mas muito jeito para fazer panquecas, que cada um é para o que nasce. Quem fizer parte do seu mundo, pode dar-se por feliz.
Mafaldinha, 20 anos, hoje.
Parabéns, meu amor

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16 comentários

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De Anónimo a 16.07.2020 às 15:10

Até eu adoraria Paris.

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